Por: Sonia Ferreira
Ainda que mulheres sejam maioria na carreira e nos cursos de graduação, pouco se fala e se estudam mulheres dentro das faculdades de arquitetura e urbanismo. Acredita-se que essa falta de representatividade afeta diretamente a forma das cidades, onde há uma super-representação de homens – grande parte brancos e de meia idade – e uma baixa representação de mulheres, sobretudo as negras.
Pensando nisso, foi lançado a Revista Arquitetas Negras. A primeira revista brasileira com conteúdo pensado e produzido exclusivamente por arquitetas negras.
A temática da revista gira em torno da produção teórica, filosófica, e crítica desenvolvidas no trabalho de design de interiores, da arquitetura e do urbanismo. Considerando que, a produção de projeto envolve tanto questionamentos teóricos quanto aspectos regionais e culturais, e que ainda que não há publicações voltadas a este nicho especifico – que é o da produção da mulher negra na arquitetura e no urbanismo – a edição da revista visa abarcar os mais diversos estudos e projetos trazendo um panorama contemporâneo desta produção arquitetônica no brasil.
De fato, é animador ver as mulheres lutando para ampliar suas vozes dentro do urbanismo. Elas têm muito a dizer sobre o ambiente urbano. Até por que a diversidade é fator de extrema relevância dentro do planejamento urbano. E salutar! A integração de gênero significa garantir que as necessidades e experiências de homens e mulheres em seu ambiente de vida sejam consideradas em patamar de igualdade. Uma maneira binária de ver a equidade.
O projeto Arquitetas Invisíveis tem levantado essa questão. O motivo dessas mulheres continuarem invisíveis e o que podem fazer para mudar esse quadro. O projeto Arquitetas Invisíveis é um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de apresentar, promover e homenagear o trabalho dessas grandes profissionais. O projeto teve início quando os fundadores tiveram dificuldade em acreditar que a participação feminina na arquitetura no século XX era tão baixa. Depois de pesquisar, eles descobriram que existem muitas mulheres arquitetas envolvidas em projetos importantes e que não ganham tanta atenção nacional ou internacionalmente.
Vamos conhecer um pouco dessas mulheres que vem quebrando barreiras na arquitetura e no urbanismo:
CARMEN PORTINHO
Carmem Velasco Portinho foi uma engenheira, urbanista e feminista brasileira, natural de Corumbá/RJ. Em 1919, lutou junto de Bertha Lutz e outras mulheres pelo direito ao voto. Foi vice-presidente e uma das co-fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Ela foi a terceira mulher a se formar engenheira no país e a primeira a obter o título de urbanista.
Obras:
- Atuou na elaboração e coordenação do projeto estrutural do Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro;
- Atuou na elaboração e coordenação do projeto estrutural do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro;
- Construção do conjunto residencial Pedregulho, em São Cristóvão, Rio de Janeiro
RAQUEL ROLNIK
Arquiteta, mestra e urbanista brasileira, graduada pela Universidade de São Paulo em 1981, doutorada em Graduate School Of Arts and Science History Department – New York University. É Professora Titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Foi Diretora de Planejamento da cidade de São Paulo durante a gestão da Luiza Erundina e secretária nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades de Lula. Por seis anos, até 2014, foi relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada.
É autora dos livros:
- Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças;
- O que é Cidade – Coleção Folha Explica;
- A Cidade e a Lei – legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo
Publicou diversos artigos sobre a questão urbana. Colaborou com a Folha de S.Paulo e mantém o Blog da Raquel Rolnik e página do Facebook onde escreve regularmente sobre questões urbanas. Escreve para a coluna semanal da Rádio USP.
ROSA KLIASS
Rosa Grena Kliass, arquiteta paisagista brasileira, considerada uma das mais importantes na história do Paisagismo Brasileiro Moderno e Contemporâneo. Entre suas obras mais significativas estão a reforma do Vale do Anhangabaú e o projeto paisagístico do Parque da Juventude, ambos na cidade de São Paulo. Foi ganhadora de inúmeros prêmios nesta área. Sagrou-se também como consultora de diversos órgãos estatais, autora de vários trabalhos publicados no país e no exterior.
Para Rosa Grena Kliass, arquiteta pioneira do Paisagismo no Brasil, a descoberta de sua vocação foi obra de um encontro no último minuto e de um amor à primeira vista.
Principais obras:
- Plano Preliminar Paisagístico de Curitiba, Paraná;
- Áreas Verdes Recreação para o Município de São Paulo;
- Estudos de Áreas Verdes e Espaços Abertos da Cidade de Salvador;
- Plano da Paisagem do Município de São Luís/MA;
- Projeto Paisagístico da Avenida Paulista – SP;
- Reurbanização do Vale do Anhangabaú – SP;
- Parque Halfeld – Juiz de Fora – MG;
- Parque Mariano Procópio – Juiz de Fora – MG;
- Parque do Abaeté – Salvador – BA;
- Parque de Esculturas – Salvador – BA;
- Parque da Residência – Belém – PA;
- Estação das Docas – Belém – PA;
- Feliz Lusitânia, Forte do Castelo – Belém – PA;
- Pátios do Museu de Arte Sacra – Belém – PA;
- Parque da Juventude – São Paulo – SP
LINA BO BARDI
Foi uma foi uma arquiteta modernista ítalo-brasileira. É conhecida por ter projetado o Museu de Arte de São Paulo (MASP) e foi casada com o crítico de arte Pietro Maria Bardi.
Lina Bo Bardi nasceu em Roma, cidade onde viveu vários anos, e cursou faculdade de arquitetura. Sua história começou a mudar quando ela se mudou para Milão, onde trabalhou com Giò Ponti, arquiteto renomado na época. Lina foi conhecida por ser uma grande pensadora. Passava horas refletindo e anotando tudo que via ao redor da cidade e usava experiências da vida antes de fazer qualquer desenho à mão. Foi uma das poucas arquitetas que conseguiu unir o moderno ao popular. Ela mostrou que o moderno pode se unir com o simples, com o plural. Usou muito da cultura em suas obras, assim como sentimentos melancólicos e impulsos revolucionários e políticos. Uniu a antropologia à arquitetura. Acreditava que um espaço era algo vivido e não somente números e plantas. Foi arquiteta, artista plástica, cenógrafa, professora e muito mais.
Obras:
- Casa de Vidro – Instituto Lina Bo e Pietro Maria Bardi, São Paulo. (originalmente a residência do casal e hoje sede do Instituto idealizado por eles);
- Museu de Arte de São Paulo, considerada sua obra prima;
- Casa do Chame-Chame, Salvador – BA;
- Casa Valéria Cirell, São Paulo;
- Solar do Unhão – Museu de Arte Moderna da Bahia em Salvador;
- Igreja do Espírito Santo do Cerrado, Uberlância – MG;
- SESC Pompéia – Fábrica, São Paulo;
- Reforma do Teatro Politeama em Jundiaí;
- Teatro Oficina, São Paulo
CHARLOTTE PERRIAND
Nascida em 1903, na França, a arquiteta Charlotte Perriand formou-se em seu país de origem e viveu até 1999. Atuou profissionalmente não só na sua terra natal, mas também no Japão, no Vietnã e no Brasil.
Charlotte Perriand é conhecida pelo seu trabalho em parceria com o arquiteto Le Corbusier. No início de sua carreira, após se candidatar para uma vaga no escritório do já famoso arquiteto e ser rejeitada com a famosa frase “Nós não empregamos bordadeiras aqui”, Charlotte Perriand reformou seu apartamento com um grande móvel em alumínio, vidro e cromo. Expôs esse trabalho em um salão e recebeu reconhecimento, inclusive do parceiro de Le Corbusier, Pierre Jeanneret. Os arquitetos reconsideraram sua decisão e a contrataram para projetar o mobiliário e o interior de seus projetos.
A partir dos anos 30, Perriand passou a focar seu trabalho em interesses sociais, em busca de projetos igualitários e populares. Participou de algumas associações de artistas, sendo mais tarde uma das fundadoras da União de Artistas Modernos.
Projetos:
- 1928 – “B306 Chaise Longue”;
- 1954 – “Chaise Ombre”;
- 1957 – Escritório Air France;
- LC2 Grand Confort;
- LC7 Swivel Chair
JOICE BERTH
Joice Berth é arquiteta e urbanista formada pela Universidade Nove de Julho e pós-graduada em direito urbanístico pela PUC de Minas Gerais. Desde o início, sua trajetória profissional na arquitetura se relaciona com o interesse pela atuação política e, hoje, Joice trabalha como assessora parlamentar. Também desenvolve pesquisas sobre questões raciais e de gênero e, em 2018, lançou o livro “O que é empoderamento?” pela editora Letramento. É colunista do portal “Justificando” e do site “Nó de oito”.
Trajetória de Joice Berth:
Formou-se tarde, como grande parte das mulheres negras no Brasil. Ainda no período de estágio foi trabalhar em uma grande empresa de engenharia social de São Paulo, que tinha projetos muito interessantes, fazendo parte da equipe de regularização fundiária. Trabalhou em outros projetos também nessa área (regularização fundiária), mas focada em urbanismo e direito urbanístico. Se especializou em Direito Urbanístico pela PUC de Minas Gerais. Trabalhou com remoção de famílias em áreas de risco, desapropriação, avaliação de imóveis. Dedicou-se à pesquisa sobre gênero, raça e cidades. Por conta das pesquisas, acabou se engajando na militância e ganhando visibilidade.
CARLA JUAÇABA
Carla Juaçaba ficou conhecida como a “arquiteta brasileira que chamou a atenção do mundo para a sustentabilidade.” Considerada uma das mulheres mais importantes da arquitetura brasileira, seu talento foi conhecido pelo mundo em 2013, quando foi contemplada com o prêmio da primeira edição do ArcVision – Mulheres e Arquitetura.
Já expôs seu trabalho com grandes nomes da arquitetura como Eduardo Souto de Moura e Norman Foster. Foi palestrante convidada na Harvard Graduate School of Design, na Universidade de Toronto e na escola de arquitetura da Universidade de Columbia. A sensibilidade da arquiteta, presente em sua fala tranquila, aparece em seus projetos que misturam tecnologia, sustentabilidade e responsabilidade social.
Principais obras:
- Em 2012 projetou o Pavilhão Humanidade 2012, concebido com a diretora Bia Lessa para a Conferência das Nações Unidas sobre Sustentabilidade Rio + 20;
- Em 2018 foi convidada pelo Vaticano para projetar um pavilhão na Bienal de Arquitetura de Veneza
KAZUYO SEJIMA
A arquiteta Kazuyo Sejima nasceu no Japão em 1956. Formou-se no seu país de origem, onde também atua profissionalmente. Possui ainda projetos em outros países, como Holanda, EUA, França, Alemanha e Espanha. Em 1992, foi nomeada como arquiteta do ano no Japão. Em 1995, iniciou sua parceria com o também arquiteto Ryue Nishizawa. Juntos fundaram o escritório de arquitetura SANAA, onde desenvolveram uma série de edifícios inovadores, dentre os quais podemos destacar o Centro de Aprendizado Rolex na Suíça e o Novo Museu de Arte Contemporânea em Nova Iorque. Em 2010, ganharam juntos o Prêmio Pritzker, um dos mais importantes prêmios de arquitetura do mundo. Kazuyo possui ainda uma carreira acadêmica. Foi professora na Universidade de Princeton, Estados Unidos, na Politécnica de Lausanne, Suíça, e nas Universidades Keio e Tama Art, no Japão.
Projetos:
- Casa Kitagata, Japão;
- Casa Shibaura, Japão;
- Centro de Aprendizado Rolex, Lausanne – Suiça
ZAHA HADID
Foi uma arquiteta iraquiana-britânica identificada com a corrente desconstrutivista da arquitetura. Formou-se em matemática na Universidade Americana de Beirute. Após se formar, passou a estudar na Architectural Association de Londres. Depois de se graduar em arquitetura, tornou-se membro do Office for Metropolitan Architecture (OMA), trabalhando com seu antigo professor, o arquiteto Rem Koolhaas. Em 1979, passou a estabelecer prática profissional própria em Londres. Na década de 1980, também lecionou na Architectural Association.
Grande parte da obra de Zaha Hadid é conceitual. Entre seus projetos executados estão:
- Vitra Fire Station (1993), Weil am Rhein, Alemanha;
- Centro Rosenthal de Arte Contemporânea (1998), Cincinnati, Ohio, EUA;
- Terminal Hoenheim-North & estacionamento (2001), Estrasburgo, França;
- Bergisel Ski Jump (2002), Innsbruck, Áustria;
- Centro Aquático de Londres (2011), Londres, Inglaterra
Zaha Hadid também realizou trabalhos de interiores alto-padrão, incluindo a Zona da mente no Domo do Milênio em Londres.
Vencedora de diversas competições internacionais, alguns de seus projetos vencedores nunca foram construídos: notavelmente The Peak Club em Hong Kong (1983) e a Ópera da Baía de Cardiff em Gales, 1994.
Em 2004, Zaha Hadid se tornou a primeira mulher a receber o Prêmio Pritzker de Arquitetura, atribuído pelo conjunto de sua obra. Anteriormente também fora premiada pela Ordem do Império Britânico pelos serviços realizados à arquitetura. Em 2015 ela quebrou a hegemonia masculina, ao ser laureada com a medalha de ouro do Royal Institute of British Architects.
DENISE SCOTT BROWN
Denise Scott Brown é uma arquiteta, urbanista, professora e escritora americana, é também membro principal da empresa Venturi, Scott Brown and Associates, situada em Filadélfia. Denise Scott Brown e o seu segundo marido e sócio, Robert Venturi, são considerados, entre outros, como os arquitetos mais influentes do século XX, tanto pela vertente de arquitetura como planeamento urbano, bem como pela escrita teórica e ensino.
Conhecida como uma grande estudiosa no campo de planeamento urbano, lecionou aulas na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e foi nomeada co-presidente do Programa de Design Urbano da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. Mais tarde deu aulas na Universidade de Yale e em 2003 foi professora convidada ao lado de Venturi na Graduate School of Design, da Universidade de Harvard. Durante os seus anos no sudoeste dos Estados Unidos, Denise mostrou um particular interesse nas cidades mais recentes de Los Angeles e Las Vegas.
CARME PIGEM
Carme Pigem Barceló é uma arquiteta espanhola. Membro da firma RCR Arquitectes, recebeu o Prêmio Pritzker de 2017, juntamente com seus colegas Ramón Vilalta e Rafael Aranda. Entre 1977 e 1979 estudou na Escuela de Bellas Artes de Olot, obtendo em 1987 a graduação em arquitetura na Escuela Técnica Superior de Arquitectura del Vallés (ETSA Vallés. Entre 1992 e 1999 trabalhou como professora de projetos arquitetônicos na ETSA Vallés e foi membro do corpo de examinadores dos exames finais de 1995 a 2004. De 1997 a 2003 foi professora de projetos arquitetônicos da Escuela Técnica Superior de Arquitectura de Barcelona (ETSAB) e membro do corpo de examinadores em 2003. Desde 2005 é professora visitante no Departamento de Arquitetura do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, Suíça.
AMAZA LEE MEREDITH
Amaza Lee Meredith, arquiteta, educadora e artista afro-americano. Meredith foi incapaz de entrar na profissão de arquiteta por causa de sua raça e seu sexo. Trabalhou principalmente como professora de arte no Virginia State College, onde fundou o departamento de arte. Ela é mais conhecida por sua residência, Azurest South, onde ela e sua parceira, Edna Meade Colson, moravam juntas. Meredith nasceu em Lynchburg, Virginia.
Apesar de não ter nenhum treinamento formal em arquitetura, Meredith projetou muitos lares para a família e amigos em Virginia, Nova York e Texas. Seu primeiro edifício foi o Azurest South, que foi concluído em 1939 e foi totalmente projetado por Meredith. O Azurest South é considerado um exemplo raro do Estilo Internacional da Virgínia e demonstra seu interesse pelo design de vanguarda. Meredith também usou o Azurest South como seu próprio estúdio de arte. Ela foi ativa em documentar seu estilo de vida e realizações no Azurest através de fotografias.
Em 1947, Meredith começou a desenvolver uma subdivisão de 120 lotes em Sag Harbor, chamada Azurest North. Para desenvolver Azurest North, ela e suas amigas criaram um grupo chamado Azurest Syndicate, que trabalhou para criar uma comunidade afro-americana de lazer. Terry Cottage e Edendot foram ambos projetados por Meredith. Foi também uma inventora recebendo uma patente de um acessório para ser anexado a uma bolsa de golfe.
Na década de 1970, Meredith desenhou logotipos para serem usados para uma proposta de mudança de nome para a Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor (NAACP).
GEORGIA LOUISE HARRIS BROWN
Arquiteta americana nascida em 1918. Trabalhou com Mies van der Rohe em projetos estruturais e também ajudou no projeto do parque do Ibirapuera em São Paulo, Brasil. Sua carreira foi marcada por episódios de racismo e sexismo e, por causa desse preconceito, mudou-se para o Brasil em 1954. Foi a única arquiteta – de qualquer gênero – a aparecer na lista anual das 100 pessoas mais influentes da revista TIME.